quarta-feira, 15 de novembro de 2017

O ENGODO DO IMAGINÁRIO


ENGODO DO IMAGINÁRIO

Quando o homem nasce é lançado fora de uma situação que era definida, tão definida quanto os instintos, para uma situação indefinida, incerta e exposta. Somente há certeza com relação ao passado – e, quanto ao futuro, apenas com relação à morte. O homem é dotado de razão: é a vida consciente de si mesma: tem consciência de si mesmo como entidade separada, a consciência do seu curto período de vida, do fato de haver nascido sem ser por vontade própria e de ter de morrer contra sua vontade.

Essencial na existência do homem é o fato de que ele emergiu do reino animal, da adaptação instintiva, transcendeu a natureza – embora sem nunca a deixar; é parte dela – e, contudo, uma vez desviado da natureza e expulso do paraíso– estado da unidade original com a natureza não pode mais voltar a ela.

O homem só pode ir à frente desenvolvendo sua razão, encontrando uma nova harmonia, que seja humana, em lugar da harmonia pré-humana irrecuperavelmente perdida.

A natureza é completamente indiferente à sobrevivência dos seres vivo. Ela é potencialmente providencial. Cada ser vivo deve por si só promover a sua sobrevivência. È evidente que existe um princípio inteligente que atua em favor da vida. A não-indiferença representa o início do "importar-se", o reconhecimento da imagem do outro, a importância de alguém que ocupa espaço físico, temporal, que faz diferença!

Porém, é importante fazer uma distinção: enquanto as coisas são, os valores Não são, mas valem! Quando dizemos de algo vale, não dizemos nada do seu ser, mas dizemos que não é indiferente. A não-indiferença constitui esta variedade ontológica que contrapõe o valor ao ser. Assim, a não indiferença é a essência do valor.

 No caso do ser humano o “princípio da não-indiferençasignifica que não permanecemos indiferentes diante dos seres que constituem o nosso mundo familiar. Eis aí o embrião da fantasia da separatividade, pois constantemente atribuímos a eles valores bipolarizados: belo e feio, bom e mau, divino e profano, verdadeiro e falso, generoso e cínico e assim por diante, construídos pelo registro do imaginário e do engodo.  

“Não há possibilidade de sobrevivência sem o todo, sem o uno. Conviver com a dualidade em uma condição de vida ou morte. Se a mente se caracteriza por ser dual, por separar, dividir, confrontar, julgar, destacar, essa mesma mente jamais poderá apreender a realidade se esta for molar, global, una ou se pelo menos for ”não dual”. Sendo a mente dual, e sendo a dialética um processo puramente mental e que consiste em analisar ou procurar apreender a realidade através da mente, a própria dialética está condenada, pela natureza do instrumento mental que escolheu a oscilar constantemente entre um homogêneo e um heterogêneo, impossíveis de absolutizar pelo fato de o próprio instrumento, autor desta oposição, ser, ele mesmo, feito de energia”. (WEIL, Pierre. As Fronteiras da Evolução e da Morte, Editora Vozes -1990. 4ª Edição, pág. 29)


CAIXA PRETA – Roberto Lanza

15/11/2017
                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                   

Nenhum comentário:

Postar um comentário