Desenho de Roberto Lanza
ATÉ ONDE PODEMOS FICAR OU AVANÇAR?
No Evangelho de Marcos 8.34-35 ele escreve o que Jesus Cristo disse: "E chamando a si a multidão, com os seus discípulos, disse-lhes: Se alguém quiser vir após mim, negue-se a si mesmo, e tome a sua cruz, e siga-me" [...} Porque qualquer que quiser salvar a sua vida, perdê-la-á, mas, qualquer que perder a sua vida por amor de mim e do evangelho, esse a salvará.
Permanecer sobre a ponte é o lugar do "porto seguro"; das certezas, da procrastinação; da "esperança milagrosa" e do "espera - ser". Seguir para o outro lado da ponte é lançar-se para a vida, é arriscar-se nas alturas e nas incertezas: é ter coragem de se rever para defrontar com a sua própria verdade de SE R fundamentalmente desamparado. Nesse sentido, torna-se necessário lançar-se na angústia existencial.
Querer satisfação plena todo mundo quer. Mas abrir mão de si pelo outro é impossível e pouco recomendável. O justo seria tentar ser fiel ao próprio desejo, mas deixando entretanto de ter um certo cuidado com a forma de lidar com isso. Afinal orientar por uma ética mais solidária talvez seja a saída. Tentar levar as coisas de tal modo que, sendo fiéis ao próprio desejo, não esqueçamos que o outro existe e que esta alteridade deve ser considerada. Isso é difícil, mas não impossível. Afinal, que graça teria se na vida fosse tudo muito fácil?
Amarga realidade é a de quem fecha os olhos para os riscos e as possibilidades de encontrar pela vida alguém, acreditando que haverá plenitude desse encontro. Haverá sim um encontro, mas será de duas faltas. A sua e a do outro. E se não se pode ver isso, o perigo é maior porque da ilusão vem logo a desilusão, lógico. Eis aí o horizonte da incompletude.
A vida é a arte das
escolhas, dos sonhos, dos desafios e da ação. Em toda perda há um ganho. Em todo ganho há uma perda. Quem
escolhe o que perder, perderá o que não escolheu. Não apague a sua estrela para
ficar se exibindo para ser notado pelo brilho do olhar dos outros.
Se
a pessoa se sente “escolhida” (veja COMPLACÊNCIA EXCESSIVA neste Blog)
permanece insatisfeita, por não ter feito a escolha que desejaria, ficando
engessada na sua capacidade de dizer “não”
para aquela posição existencial. Como a
vida é uma metáfora de quem você aparenta que é, a negação da sua verdade inconsciente se manifesta sob a forma de decepção
e de insatisfação através dos sintomas. Assim, a pessoa permanece no cativeiro
sequestrada por si mesma. Acontece que o sequestrador (o outro de si mesmo) cobra
o resgate (na natureza ninguém fica impune por não querer ser a si mesmo)
colocando a pessoa angustiada e frustrada, que vai crescendo cada vez mais como
uma bola de neve, em razão do desconhecimento crônico de si mesma. .É ai que reside a alienação existencial.
Pior
ainda, a pessoa fica na expectativa de uma solução mágica, gerando ansiedade e
frequentemente imobilizada diante dos desafios da vida cotidiana, em razão do
estado de assujeitamento a quase tudo, por ignorar a sua própria verdade e o
próprio ser. Nunca fique na “esperança milagrosa” de que o mundo
vai mudar para melhorar a sua vida. O outro lado da ponte é lugar onde se localiza o vazio existencial, o qual cabe a cada um preenchê-lo mediante a contabilização das suas realizações pessoais. Ninguém nasce com receituário e bula para orientar o seu destino. Conquistar o seu estar no mundo é tarefa penosa de cada um.
O
que todo mundo precisa é do resgate do próprio SER mediante a libertação das amarras de sua alienação existencial na
linguagem e, inconscientemente, nos fortes laços afetivos indestrutíveis e
profundamente enraizados que mapearam a sua realidade psíquica..Somos "plugados" demais ao nosso romance familiar vivenciados na pequena infância.
Vejamos
a seguinte poesia:
Ah, todo o cais é uma
saudade de pedra!
E quando o navio larga
do cais
E se repara de repente
que se abriu um espaço
Entre o cais e o navio,
Vem-me, não sei por que,
uma angústia recente.
Uma névoa de sentimentos
de tristeza
Que brilha ao sol das
minhas angústias relvadas
Como a primeira janela
onde a madrugada bate,
E me envolve como uma
recordação duma outra pessoa
Que fosse
misteriosamente minha.
PESSOA,
Fernando. Ode MARÍTIMA. O eu profundo e os outros eus. Rio de Janeiro; Nova
Fronteira.
Essa
“pessoa
misteriosamente minha” é na verdade uma falta primordial, protótipo da
angústia e da saudade: falta que não é do outro, mas do próprio ser, segundo o Psicanalista Lacan. Quer você
entenda quer não, o ser humano é
estruturalmente um SER de falta de presença constante. Enquanto viver sempre estará
faltando-lhe alguma coisa. Somos seres recorrentes à nossa originalidade.
Como
falta e desejo são coexistentes, no lugar da falta surge o desejo. Desejo
que, é caracterizado por uma "presença
de uma ausência”; é a “nostalgia de algo perdido”, segundo Lacan.
Aqui cabe a seguinte citação: O desejo é a própria essência do homem, ou seja, o esforço pelo qual o homem se esforça por perseverar no seu ser". (Baruch Spinoza).
“Esse
algo ou objeto perdido”
quer dizer, segundo Lacan: Outro (Grande outro primordial). Primeiro objeto de
amor da criança, ou seja – quem exerceu a função materna (geralmente a mãe
biológica). No entanto, quem tem tudo a tempo e a hora nada tem a desejar. Se esse elo não for rompido nada faltará ao sujeito e em contrapartida não haverá desejo. A falta é uma condição essencial para o surgimento do desejo. Caso
contrário, seremos um ser desprovido de
motivação para viver
Eis
que o desejo torna-se a grande aventura humana! Mas, para vivermos na
civilização torna-se necessário suportar a sua insatisfação (sublimação), como
o preço que ele próprio se impõe. É o preço que se paga por uma realização
possível. Da onipotência da satisfação,
o sujeito passa para a possibilidade da realização.(Ver artigo publicado neste
Blog denominado “UMA QUESTÃO DE VIDA
OU MORTE”).
Na
busca do elo perdido, o homem se aventura a relacionar-se.
Tudo que encontra, porém, é a incerteza, a falta de garantias. De nada
adiante reeditar o Grande Outro, pois ele não pode oferecer o Bem Supremo.
Entregar-se a esse Outro é o que ele tenta fazer, sustentando ainda a ilusão de
que se tudo lhe der, correspondendo ao que imagina ser esperado dele, do Outro
tudo terá. Ou seja, sendo ele tudo o que o Outro espera só para ele o Outro
existirá também. Não é preciso ter horror da falta e nem da obscura autoridade do Outro, porque o Outro doa amor e não requer prova de amor do filho, Mas ele permanece na condição de que ele é que é o agente responsável para garantir tal reciprocidade, que não passa de uma fantasia. para suprir o desejo do Outro..Tal suposição torna-o o objeto que complementa o Outro.
Pura
repetição infantil, em que o sujeito ansiava pelo puro reconhecimento de seu
desejo, para ser o objeto único de desejo do Outro.
Mas
quem não quer ser reconhecido? Entretanto, será apenas no suporte da
insatisfação que certo reconhecimento será possível ao desejo e ao sujeito: Se
antes via apenas o Outro, e, portanto a si mesmo, agora deve ver o outro,
aquele que desvia os olhares do Outro e dele mesmo, fazendo-se conhecedor de
uma falta que não se completa nunca. Ao abrir Mão do reconhecimento absoluto, o
sujeito ingressa numa outra via: a da possibilidade de existir, pois de modo
diverso, o reconhecimento de um implicaria na morte do outro.
Assim,
o ser humano é um ser dividido numa busca constante da sua outra metade
supostamente perdida. Pura ilusão! Não há possibilidade de sobrevivência sem o
todo, sem o uno. Conviver com a dualidade é uma condição de vida ou morte.Eu sou eu mesmo e nada me falta.O que existe na realidade é a Fantasia da Separatividade
CAIXA PRETA Roberto Lanza
17/05/2015
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